Por Walmir Rosário
Foto: Valdir Gomes |
Do alto de sua sabedoria, o jornalista e escritor Antônio Lopes costuma nos ensinar que começamos a desconfiar que estamos ficando mais velhos quando os nossos amigos vão nos deixando. E nos deixando de vez, partindo desta para a melhor, como costumam dizer as pessoas chegadas aos elogios fáceis e gratuitos para consolar as famílias e os amigos do de cujus.
E essa constatação vai ficando mais presente nas pessoas de minha geração. Desaparecem os amigos de infância e os que conseguimos fazer durante os anos, seja m na escola, no trabalho, nas atividades de lazer, nas mesas de botecos. Não importa, chegada a hora, vencida a obrigação, o sujeito tem de adimplir o contrato firmado com o Pai Eterno. Podemos, até, resmungar que não seria chegada a hora, mas não importa, a morte é implacável.Nesta sexta-feira (15) chegou o dia aprazado de Eduardo Anunciação. E ele teimou em não cumprir o aprazado, relutando em fazer a última viagem, ficando mais um tempo por aqui. Teimoso como ele só, buscou a ajuda médica, passou por cirurgia, relutou ao ócio durante o restabelecimento, continuou a trabalhar até não mais aguentar.
Essa atitude é própria da natureza do jornalista que preza sua profissão, na maioria das vezes remando na contracorrente, por se colocar – de forma intransigente – contra a intolerância, se indignando contra as desigualdades. Como dizia Voltaire, “Eu posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o direito de dizê-la”.
E assim Eduardo Anunciação viveu seus 67 anos na plenitude dos seus direitos. Agitador, sim, esse seria o melhor adjetivo para qualifica-lo. Sim, pois antes do jornalismo foi líder estudantil, vereador, agitador cultural, jornalista. Essa foi a sua trajetória, que está gravada na mente de seus contemporâneos e registrada nos veículos de comunicação.
Como vereador, inovou a se eleger com apenas 18 anos por um partido de direita, a Arena, embora tenha dedicado seu mandato às causas de Itabuna, principalmente à cultura. Junto com figuras de sua idade – ou poucos mais velhos – promoveram, nos fins dos anos 1960 e início de 70 a maior revolução cultural de Itabuna.
No mesmo grupo, Eduardo Anunciação, Jorge Araujo, Roberto Junquilho, Chiquinho Briglia, Maria Antonieta, dentre outros promoveram, cada um na sua especialidade, ações culturais nas mais diversas expressões artísticas, colocando Itabuna no circuito cultural brasileiro. Nessa época, contávamos com o Teatro Estudantil Itabunense (TEI), o Teatrinho ABC, exposições de arte plásticas, eventos literários e o jornalismo em plena ebulição.
Em todas essas manifestações lá estava Eduardo Anunciação, o Gaguinho, com sua voz rouca, porém ouvida. Aqui, era amigo de toda a turma da cultura, desde os iniciantes no teatro, na música, na literatura, como aos já consolidados, a exemplo do nosso poeta maior: Firmino Rocha, autor de “O Canto do Dia Novo”, “Momentos” e o mais conhecido de todos “Deram um Fuzil ao Menino”, que se encontra gravado numa placa de bronze na sede da Organização das Nações Unidas (ONU).
Como jornalista foi editor de jornais e manteve espaços cativos em jornais e revistas elaborando artigos e colunas, estas conhecidas e “devoradas” devido ao seu estilo inconfundível de escrever, sobretudo sobre política e políticos. Assessorou políticos de diferentes partidos, circulando com desenvoltura em todos os espaços e agremiações. Direita, centro e esquerda, pouco importava, exercia seu trabalho com dignidade.
Trabalhamos juntos em algumas oportunidades, inclusive na Divisão de Comunicação da Ceplac (Dicom), onde exerceu a chefia num dos períodos mais conturbados da política brasileira: a volta do país à democracia. Com sua experiência, sabia desarmar os espíritos, conquistar novos amigos, mesmo em circunstâncias das mais adversas.
Eduardo Anunciação viveu…, soube viver com sabedoria, sempre se lembrando dos amigos, personagens que sempre tratava com carinho na sua coluna, Há anos no Diário Bahia, colocada em página de destaque pelo publisher Valdenor Ferreira. E sua coluna era um sucesso editorial, primeira leitura obrigatória nas manhãs, conforme confidenciavam seus inúmeros leitores. Mesmo os desafetos tinha a preocupação de lê-lo para conferir as notícias.
Na contramão das características dos radialistas, sua voz rouca foi parar no rádio, mas exatamente na Musical FM, de Itabuna, analisando fatos e políticos. Há alguns anos se mudou para Ilhéus e sempre que me encontrava dizia:
– Rosário, minha jurisdição aqui em Ilhéus é só na zona sul, só vai até a ponte – numa referência à residência no bairro Hernani Sá.
Nada disso, era tudo modéstia, pois toda a Ilhéus aguardava com ansiedade sua participação no Programa “O Tabuleiro”, apresentado por Elivaldo Vila Nova.
Agora, resta apenas o silêncio!
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